quarta-feira, 30 de dezembro de 2020

O desafio de gerar emprego e renda em Itatiba

 



O prefeito eleito de Itatiba, dr. Thomás Capeletto de Oliveira, e seus futuros secretários, tomam posse com uma pauta imensa de trabalho. Além da prioritária saúde pública, comprometida pela Covid 19, gerar empregos será certamente uma das necessidades mais urgentes. Não se trata de uma questão-chave apenas para Itatiba, mas também de toda a sua região. Quase metade da força de trabalho paulista (48%) está em situação vulnerável no mercado de trabalho, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), do IBGE. Itatiba, infelizmente, não escapa dessa realidade, que se tornou mais aguda durante a pandemia.

Neste artigo, sugiro oito ações administrativas que, em minha opinião, serão benéficas para a geração de emprego e renda em Itatiba. Algumas das recomendações são até mesmo fácil de serem implementadas. Outras dependerão de investimentos públicos, de medidas jurídicas, de compromissos com a inovação e, acima de tudo, de apoios políticos. A adoção de Parceria Púbico-Privada (PPP) nesse campo, bem como o apoio do Senai, Senac, Sesi e Senar e a participação efetiva da Aicita e do Sebrae, pode facilitar a criação de um círculo virtuoso no mercado de trabalho da cidade. Sugestões:

1.   Mercadão. O mercado municipal merece ser tratado com carinho e respeito e ser reposicionado como Mercadão, protagonista na área de alimentação de Itatiba. Seus espaços vazios podem ser ocupados periodicamente por pequenos produtores rurais, pelas indústrias alimentícias e de bebidas da cidade para a exposição, venda e degustação de seus produtos.

2.   Indústrias já instaladas. A criação de um departamento municipal de networking e de soluções para o desenvolvimento industrial certamente trará vantagens para às empresas. A proposta seria mapear as principais demandas desses empresários quanto a incentivos, logística e formação de mão de obra especializada e adotar políticas públicas inovadoras para solucioná-las.

3.   Cluster de decoração. Itatiba já se consolidou como um polo de fabricação e venda de móveis, o que atrai a visita de turistas, mas precisa dar um passo adiante e se reposicionar como centro de inovação em decoração. Revigorar e reurbanizar a região da avenida 29 de Abril e da rua Luiz Scavone, onde se concentram as inúmeras lojas de decoração e políticas públicas municipais seriam decisivas para o investimento privado na abertura de novas lojas e indústrias moveleiras.

4.    Incubadoras.  O projeto de criação de incubadoras está no plano de governo do dr. Parisotto e deve ser aproveitado. Basicamente, consiste em oferecer aos pequenos empreendedores um espaço físico com toda estrutura necessária para iniciarem as suas atividades. Trata-se de um incentivo e fôlego inicial para a formação de novos profissionais e empresas. A cidade dispõe de locais para esse fim, como o Palacete Damásio, na esquina da Praça da Bandeira. No mesmo espaço pode ser implantada a Incubadora de tecnologia. Devemos nos lembrar de que a Apple nasceu em uma garagem. Parcerias da Prefeitura com a Universidade São Francisco (USF) e outras instituições educacionais da região teriam imenso valor para o desenvolvimento de um polo de startups.

5.       Incubadora de pequenas indústrias e prestadores de serviços. No mesmo molde das duas sugestões anteriores, a proposta é permitir a criação de pequenas empresas em espaço temporário fornecido pela Prefeitura. O custo pode ser reduzido por meio de PPPs. Sugiro o espaço antes ocupado pelas duas unidades da Têxtil Elizabeth, no centro da cidade, para esta finalidade.

6.   Grande Glicério. O centro comercial de Itatiba é uma região que vai além da rua Francisco Glicério. Inicia-se na rua Maria de Lourdes Abreu e termina nas proximidades da Santa Casa. Esse grande corredor de compras e de lazer dispõe de lojas âncoras que poucos centros comerciais e shoppings da região têm. Reurbanizar essa grande área e criar facilidades de acesso a ela certamente gerarão maior movimento. Os incentivos para estacionamentos e a criação de uma linha de micro-ônibus gratuitos para circular nesse trajeto o seu percurso seguramente contribuirão para a melhoria do acesso e do trânsito.

7.      Turismo. Itatiba é um Município de Interesse Turístico, faz parte do Circuito das Frutas, sedia o Zooparque, recebe eventos em suas fazendas, conta com um centro histórico, belos parques e tem uma excelente localização. Mas precisa de boas campanhas de comunicação e da integração dessa atividade com o comércio local. Com o turismo, o dinheiro vem e fica na cidade, além de gerar empregos e renda.

8. Centro Empresarial e Logístico. As últimas administrações municipais se mostraram míopes em relação a uma vantagem geográfica de Itatiba. A cidade está ao lado da Rodovia D. Pedro I e próxima às principais rodovias do Estado e do Aeroporto de Viracopos. Nossas vizinhas Jundiaí, Jarinu, Louveira, Vinhedo e Valinhos enxergaram a oportunidade similar para se tornarem centros empresariais e logísticos. Itatiba conta com espaços para a atração desses investimentos e, para a construção de sua infraestrutura, pode se valer 100% das PPPs.

Vivemos, lamentavelmente, um momento de incerteza não só em Itatiba. A pandemia interrompeu hábitos e mudou a maneira de se fazer negócios. A economia da cidade não voltará à normalidade imediatamente e é bem provável que, ao nos vermos livres da ameaça do coronavírus, nos vejamos diante de um "novo normal". À gestão do prefeito Capeletto caberá os difíceis desafios de preparar a economia de Itatiba para se tornar mais ágil e competitiva. Trata-se de prepara-la para o futuro.

Artigo publicado no Jornal de Itatiba, coluna Opiniões. 31/12/2020

Fabio Chrispim Marin

Publicitário e consultor de Marketing Político.


quinta-feira, 3 de dezembro de 2020

Dr. Thomas Capeletto: mudança ou continuidade?

 



    Além de administrar Itatiba com um caixa limitado de recursos, o principal desafio do futuro prefeito municipal, Dr. Thomas Capeletto de Oliveira, será conquistar a aprovação da larga parcela da opinião pública que não lhe deu seu voto. Dos 82.243 eleitores de Itatiba, o candidato do PSDB obteve 20.503 votos, o que significa que 75% do eleitorado itatibense não votou no candidato eleito em 15 de novembro. O prefeito Douglas Augusto Pinheiro de Oliveira (DEM) igualmente recaiu em erro ao subestimar os 71,5% dos eleitores que não votaram nele há quatro anos. A miopia do poder não lhe permitiu pousar um olhar sensível a esses itatibenses que, durante a disputa de 2020, certamente reforçaram sua taxa de rejeição.

    A nomeação dos secretários de administração de Douglas em 2017, sem conhecimento histórico, cultural e geográfico de Itatiba, causou o primeiro desconforto. Sua imagem piorou com as crises da Alface, a devastação das margens do Ribeirão Jacaré, as filas para cirurgias nos hospitais e a falta de transparência sobre os R$ 15 milhões recebidos do governo federal para fazer frente à Covid-19. Durante a pandemia, suas atitudes se espelharam nas do governador João Dória (PSDB) - imposição de barreiras sanitárias e fechamento do comércio - e causaram prejuízos aos comerciantes, além da elevação do desemprego.

    Politicamente, o prefeito Douglas errou também ao "trocar" apoio partidário na Câmara Municipal por cargos públicos. Para tanto, criou secretarias e diretorias "hereditárias", para os quais políticos com ou sem mandatos conseguiram dele a nomeação ou renomeação de seus parentes e esposas. Na eleição de 2020, o resultado chegou a ser trágico para Douglas, que contava com a máquina municipal em suas mãos, e mostrou-lhe por que não se pode lutar com as armas do inimigo: os partidos de sua base com 11 vereadores eleitos nesta eleição tiveram 29.597 votos, enquanto o prefeito recebeu apenas 19.901 votos.

     A história itatibense também explica a vitória do PSDB sobre o DEM/Cidadania na eleição de 2020. O eleitor se mostra temerário e crítico quanto ao futuro quando há turbulências políticas, administrativas e/ou grandes perdas para a cidade, como enchentes e pandemias. Desde a primeira eleição para prefeito de Itatiba depois do Estado Novo, em 1947, houve nessas condições duas situações em que o eleitor itatibense mudou a gestão política da cidade:

    1º Situação: Epidemia e perda de patrimônio municipal

    1951 - Os vereadores eleitos pelo PTN do prefeito Erasmo Chrispim migraram para o PTB, que elegeu Ettore Consoline. Durante o mandato de Ettore, houve dois acontecimentos marcantes na cidade: a desativação da Estrada de Ferro Itatibense, em 1952, e a epidemia da febre tifoide, dois anos depois, que contaminou 909 dos 18.258 habitantes.

    1955 - Erasmo Chrispim (PTN) foi novamente eleito ao derrotar o candidato apoiado por Ettore Consoline, seu vice Pedro Mascagni (PTB-PSP).

    2º Situação – Rejeição, enchentes e pandemia.

    2012 - Os itatibenses reelegem João Fattori (PSDB) que, no biênio 2015-2016, entrega a presidência da Câmara à oposição. O ano de 2016 foi péssimo para a gestão tucana: Itatiba enfrentou em março uma de suas piores enchentes, que deixou inúmeros desabrigados, destruiu lojas, indústrias, escolas, pontes e vias e, em agosto, 192 funcionários comissionados foram exonerados por determinação do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP). Fattori encerrou seu mandato com alta rejeição.

    2016 - O vereador Douglas Augusto, principal opositor de Fattori na Câmara Municipal, elegeu-se prefeito de Itatiba. Além dos problemas politico-administrativos citados acima, enfrentou a pandemia da Covid-19. Também encerrou o seu mandato com alta rejeição.

    2020 – O PSDB elege o Dr. Thomas Capeletto, e Douglas entra para a história como o primeiro prefeito itatibense a não ser reeleito desde 2000, quando houve a primeira disputa em que prefeitos puderam novamente concorrer.

    Esperamos não ser desafiados por intempéries climáticas, crises político-administrativas ou flagelos para a saúde coletiva de Itatiba nos próximos anos e que o Dr. Thomas nomeie seus secretários com base em critérios técnicos, sem se submeter, por ambição de uma rápida aprovação de seus projetos, aos caprichos de alguns vereadores. Este é o momento de saber quais autoridades terão espírito público e demonstrarão fidelidade ao povo itatibense.

    Itatiba precisa ser reconstruída economicamente, necessita gerar mais emprego e renda para a população. E, principalmente, precisa que o prefeito contribua para o resgate da dignidade e do respeito da Câmara Municipal, onde os debates devem se reger pelo interesse comum e não mais pela comodidade dos votos trocados por cargos. É o que o Legislativo e o povo itatibense merecem.

    Fabio Chrispim Marin

    Consultor de Marketing Político e Membro da Academia Itatibense de Letras.

    Publicado no Jornal de Itatiba. 05/12/2020. Coluna Opiniões

 

 

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segunda-feira, 14 de setembro de 2020

A Vingança de Pelágio

 












Um Causo Político - Ecológico

Pelágio Lafayette Jr, funcionário público concursado, com seis prefeitos no seu currículo. Pela sua dedicação, ou segundo alguns colegas, pelo seu "puxa-saquismo crônico" sempre ocupava cargos comissionados no segundo escalão. Leitor e frequentador assíduo da Biblioteca Municipal, seu livro de cabeceira era a trilogia FEBEAPÁ – Festival de Besteiras que Assola o País, do jornalista Sergio Porto -"Stanislaw Ponte Preta". O Festival escrito na década de 1960 relata as muitas ações da época da Ditadura Militar, onde abundava as besteiras dos censores e das "otoridades necessitadas de aparecer na mídia". Nas reuniões do café da tarde na prefeitura, Pelágio gostava de citar os causos do FEBEAPÁ, performático ao narrar as histórias, sempre associava algum político local como personagem da narrativa. Diversão garantida!

 Perto de sua aposentadoria assumiu um novo prefeito. A eleição foi acirradíssima e polarizada entre os dois partidos mais fortes da cidade. O PTGQ – Partido Tradicionalista Gente de Quem, que administrou a cidade nos últimos anos e o PBS – Partido do Bolchevista Sonhador, que fez forte oposição à administração anterior e ganhou a eleição com larga margem de votos. Na posse do novo prefeito, uma frase no discurso marcou para Pelágio qual seria o seu destino. "A história desta cidade começa a ser escrita agora... chega de tradição". O recado estava dado. Ele membro ativo desde a fundação do PTGQ, perdeu o seu cargo comissionado na prefeitura e foi designado para servir na Secretaria de Obras e Meio Ambiente. O novo posto na realidade era uma "geladeira". Ele não tinha autorização para fazer nada. Ordens superiores... Ficava encostado o dia todo sem ter o que fazer, nem seus livros ele podia ler! A situação deixava-o vexado. Mas era paciente! Atento aos detalhes da administração sabia que seu "ostracismo ditatorial" não ia durar para sempre.

  Após dois anos, enfim apareceu a sua grande oportunidade! O prefeito atendendo a uma solicitação e ação judicial do Clube dos Lojistas determinou o corte de vinte árvores em plena florada e, também, a retirada dos seus canteiros na Rua Direita, centro da cidade. Foi uma crise sem precedentes! Ambientalistas, a imprensa escrita e falada, comerciantes e parte da população ecologicamente ativa ficaram indignadas com o corte das árvores. Nas redes sociais os paladinos e a "paladina" oficial do prefeito, tentavam a todo custo reverter a crise. Sem efeito! O Secretário de Obras e Meio Ambiente, prevendo os problemas que enfrentaria, rapidamente tirou umas férias (já vencidas, tinha o direito!). O gerenciamento da crise caiu no colo de Pelágio. O Secretário de Governo julgava que, dentre os funcionários da secretaria ele seria o mais capacitado e letrado para elaborar e redigir um bom release para a imprensa. Ele aceitou prontamente a honrada incumbência, comprometendo-se perante o Prefeito e demais secretários, a redigir o documento com muita transparência. Sua missão era "inocentar totalmente" a administração municipal. Sentiu-se orgulhoso pelo voto de confiança que recebera da administração municipal.

 Munido de todo processo, recortes do jornal, prints dos comentários nas redes sociais e do memorando com as orientações para o release, ajeitou calmamente a papelada na mesa e trocou a fita da sua Remington BJ, relíquia de seus quase trinta anos de prefeitura. Não usava computador, era tudo datilografado e, somente usando um único dedo, o indicador da mão direita. Era rápido e preciso na sua BJ, não errava um único memorando. Não perdeu tempo e datilografou:

 Em razão do mal entendido sobre a retirada das árvores da Rua Direita, que alguns cidadãos, equivocadamente, falam que foram "cortadas", a Prefeitura Municipal vem respeitosamente esclarecer que a referida obra foi executada para cumprir uma decisão judicial. A ação na justiça local foi proposta pelo Clube dos Lojistas, que apontou desperdício de recursos públicos com a construção dos canteiros e no plantio das árvores. Esclarecemos que após minuciosa auditoria interna, chegou-se ao consenso que a ação judicial foi procedente. O Senhor Prefeito indignado com o mau uso do erário público, pela administração do PTGQ, expediu prontamente a ordem para a retirada total dos canteiros e das árvores, eliminando assim, para sempre, mais uma das inúmeras "heranças malditas" deixadas pela administração anterior. Para o nosso Líder "as espécies plantadas foram escolhidas de forma incorreta, como são também as árvores da Rua Major Sólon, com as suas calçadas largas, sombreadas e com seus canteiros floridos e cuidados pelos próprios lojistas. Não podíamos permitir acontecer duas vezes o mesmo erro de projeto! Outro ponto importante para que a população entenda que, além de não serem compatíveis com o local, as árvores causavam problemas na rede elétrica; mesmo que os postes de energia estivessem do lado oposto da rua, como a Avenida do Cemitério, onde árvores e postes convivem em harmonia, fazendo sombras além do necessário". Concluiu o exasperado Alcaide.

 O Secretario de Obras e Meio Ambiente, interrompeu as suas merecidas férias para esclarecer, via telefone, que está tranquilo quanto à execução da obra: "Retiramos as árvores sim! Acatamos uma ordem judicial e critérios técnicos também foram avaliados, onde foi provado cientificamente que as espécies não eram adequadas ao local, ELAS CRESCEM NA VERTICAL e, comprometem a rede de energia elétrica" Concluiu convictamente aquele secretário.

Já o Secretário de Governo, comedido como sempre, analisou o caso de uma forma positiva: "esta manifestação toda foi criada por quem plantou aquelas árvores e, sabem do erro que cometeram! Nossa administração atenta às demandas populares, fez com que tivéssemos um momento de reflexão e aprendizagem: Não devemos plantar árvores que crescem na vertical em vias públicas! Portanto, já preparamos um projeto de Lei que será enviado à Câmara Municipal, onde temos a maioria e, que nos obedecem cegamente, para proibir definitivamente em nossa cidade o plantio de árvores que cresçam na vertical". Afirmou, categoricamente, o Secretário.

 O presidente do Clube dos Lojistas, autor da ação judicial, contatado por esta assessoria em sua residência, no vizinho município de Vila de São Carlos, foi enfático, mas confuso na sua declaração: "Nós somente fazemos o que os associados querem e, principalmente, o que a Prefeitura pede. Estou cônscio das atitudes que tomamos e continuaremos trabalhando firmemente para a integração da nossa entidade com o poder público. Todas as solicitações que nos chegam são prontamente atendidas, como a recente implantação do Caça Níquel Rotativo em diversas áreas do nosso centro comercial. Com a expansão do estacionamento regulamentado a prefeitura aumentou a sua arrecadação significativamente! Foram aplicadas milhares e milhares de multas que contribuíram para o desenvolvimento econômico do município e, para os críticos, cito mais um ponto positivo para implantar os Caça Níqueis: por nossa sugestão, todas as moedas arrecadadas nos parquímetros abastecem os comércios de cidades de toda a região."  Finalizou o industrial, presidente do Clube dos Lojistas. 

 O release foi um sucesso! Publicado na íntegra, na imprensa local e compartilhado milhares de vezes nas redes sociais, se tornou o meme do momento na cidade. Desde então, Pelágio foi designado o quarto assistente do assessor do administrador do arquivo morto da prefeitura, localizado ao fundo do lixão municipal. Porém, feliz e com a alma lavada! Agora realmente não tem nada o que fazer, tem um belo salário, pode ler os seus livros e... Levou consigo a sua Remington BJ.

 

Esta é uma obra de ficção, qualquer semelhança com nomes, alcunhas, pessoas, cargos, entidades, autarquias, personagens, autoridades, localização, acontecimentos ou fatos da vida real será mera coincidência.

Publicado no Jornal de Itatiba, Coluna Opiniões,  em 12 e 19 de setembro de 2020

 

sábado, 16 de maio de 2020

Cuidado na pré-campanha




Sem profissionalismo, candidatura pode fracassar na Justiça Eleitoral.
As mudanças na atual legislação eleitoral que serão aplicadas nas eleições municipais deste ano podem causar problemas muito mais sérios do que os atuais pré-candidatos imaginam. Todo cuidado será pouco até mesmo na fase de pré-campanha. Para a Justiça Eleitoral, as normas objetivam a dar chances iguais e proporcionais a todos os concorrentes do pleito. Mas há detalhes que, se não cumpridos à risca, poderão levar à impugnação de vencedores até no momento da diplomação.

Para o controle de abuso de poder econômico, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em suas resoluções, adotou um limite de gasto para os candidatos e exigiu uma prestação de contas mais criteriosa. Também baixou diversas proibições, como a doação financeira por parte de empresários, os "showmícios", a distribuição de brindes, o envelopamento, a pintura de muros, os outdoors etc. Não falo aqui como advogado, que não sou, mas como estudioso de Marketing Político e das leis e regulamentações eleitorais para melhor orientar os meus consultados e para impedi-los de incorrer em erros que podem lhes custar até a vitória nas urnas.

Uma das minhas principais orientações é justamente a consulta frequente a um advogado especializado. Atos equivocados, que afrontem as novas regras, podem resultar em multas, em inegibilidade, em detenção e na cassação do mandato conquistado. Na eleição de 2018, por exemplo, surgiu o caso da senadora Selma Arruda (PODE - MT), mais conhecida como a "Moro de Saias", que investiu somente na sua pré-campanha mais de R$ 1,5 milhão. Acabou cassada e tornou-se inelegível por oito anos por uso de caixa dois e abuso de poder econômico.

Os pré-candidatos devem compreender, inicialmente, que o Direito Eleitoral é diferente de outros ramos, como o Civil. Na Justiça Civil, a interpretação da lei é positiva, respeita a observância do texto escrito. A legislação eleitoral é interpretativa. Não existe uma formula pronta. A interpretação do texto da lei varia de acordo com a ação, o local, os gastos/investimentos, o número de eleitores, o impacto. Enfim, há inúmeras variáveis. Os prazos na Justiça Eleitoral são definidos por horas e dias corridos, e o período é segmentado: 210 dias de pré-campanha e 45 dias de campanha, com cada um destes períodos com sua regulamentação. Há ainda três tribunais: o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o Tribunal Regional Eleitoral (TRE) e o principal, o Juiz Eleitoral da Comarca. É nas mãos dele que começa o processo. O juiz fará a primeira interpretação da lei e decidirá, observando a eleição como um todo no pleito local, as punições judiciais para cada caso condenado.

Quando a redação do artigo 36 A da Lei 13.165, de 2015 diz que "Não configuram propaganda eleitoral antecipada, desde que não envolvam pedido explícito de voto a menção à pretensa candidatura, a exaltação das qualidades pessoais dos pré-candidatos", quer dizer que pode enaltecer o seu currículo, mas estão proibidas as frases "vote em mim", "conto com você em 2020", "Fulano 2020". Porém, surgiu uma nova interpretação sobre o que significa pedido expresso, que agora envolve a propagação do plano de governo e a ampla divulgação da imagem, mesmo que disfarçada, do candidato.

Esta eleição vai ser atípica. Por conta da pandemia de Covid-19, não sabemos a data em que vai ocorrer, como serão as convenções partidárias e se serão mantidos os prazos já previstos. O futuro presidente do TSE, ministro Luís Roberto Barroso, afirma que haverá eleição. Por isso, os pré-candidatos e os partidos, neste momento, devem se concentrar no que pode ser planejado desde já, como a arrecadação de recursos para a campanha. Pela primeira vez numa eleição municipal, teremos o crowdfunding, o financiamento coletivo, que estará disponível a partir de 15 de maio. Também será permitido aos candidatos vender produtos como canecas, camisetas etc. Mas todo o cuidado será pouco nesse caso. O valor dos objetos, para bem lembrar, será interpretado por juiz. Vender uma camiseta por R$20 quando ela vale R$20 é um caminho para a impugnação.

Mesmo na fase de pré-campanha, os candidatos devem se lembrar que não estão sozinhos no jogo. Para haver uma investigação da Justiça Eleitoral sobre um caso suspeito, será preciso apresentar as denuncias e as provas. Não dar razões nem provocar desconfiança é receita de sucesso. Um adversário pode já estar registrando em ata notarial das ações disseminadas por outro candidato nos seus perfis nas redes sociais - até mesmo aqueles feitos "voluntários e solidários" nesta época de escassez da Covid-19. Com a confirmação da candidatura do oponente ou até mesmo em sua diplomação, ele estará apto a propor uma Ação de Investigação da Judicial Eleitoral (AIJE) e a estragar com a festa do rival. Convencer o Juiz Eleitoral de que as ações tiveram caráter filantrópico e que somente as fez para ajudar o próximo será um argumento difícil de se provar. Se quiser ajudar, vá em frente. Será muito bem-vindo. Mas dar publicidade a esse ato será o caminho para a perdição.

Esquecer máximas como "eu sempre fiz assim", tomar cuidado com o que posta ou responde nas redes sociais, manter ao lado um consultor de marketing, um contador e um advogado especialista em Direito Eleitoral são itens indispensáveis para o sucesso de uma campanha nas próximas eleições. Volto a repetir: a Justiça Eleitoral é diferente da Civil. Avaliar os níveis de riscos ao tomar uma decisão que esbarra na legislação eleitoral é mais do que medida de prudência. As mudanças nas regras oferecem boas opções para uma campanha justa e igualitária nos municípios e exigirão profissionalismo e criatividade na escolha do melhor caminho para atingir o eleitor sem incorrer em problemas com a Justiça no futuro.

Fabio Chrispim Marin
Artigo publicado no Jornal de Itatiba, coluna Opiniões, edição de 16/05/2020